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Alice sem maravilhas...

domingo, 6 de junho de 2010


Assisti o famigerado Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton (ganhei os ingressos depois de comprar uma botinha linda na Melissa!!!).  Confesso que esperava um grande espetáculo, nos moldes de Avattar, afinal, filmes em 3D estão na moda e mesmo que a história seja ruim, o 3D salva.

Mas essa não foi a minha impressão. Com relação à Alice duas grandes crateras se abriram durante o longa: uma concerne o visual, a outra o conteúdo.

Li muitas críticas desse filme, mas nenhuma delas, no entanto, me impressionou mais que Lucino Ramos. E como historiadora que sou, a hipótese do autor é bem audaciosa. Vejamos:

Há de fato uma maciça dose de mistério cercando esse trabalho de Tim Burton. Vejamos: por que motivo ele atribuiu à protagonista a idade de 19 anos, colocando-a como herdeira de um poderoso empresário de comércio internacional? E por que, na última cena, ela toma um navio mercante em direção à China, no comando de uma missão de negócios?

A adaptação do livro do inglês Charles Dodgson (1832-1898), publicado sob o pseudônimo de Lewis Carrol em 1865 – ano em que se iniciou uma guerra de 4 anos entre a China a Grã Bretanha, conhecida como a 2ª Guerra do Ópio. O que era mesmo aquilo que a lagarta azul fumava de um narguile, sentada num cogumelo?

O que ela iria comprar e vender no então chamado Império do Meio? A pista para responder está na História. Naquela época, os britânicos importavam seda, porcelana e chá (...). Ingerir essa infusão de ervas era um hábito tão importante que servira de gancho para uma revolta considerada um dos estopins da guerra da Independência dos Estados Unidos: a “Boston Tea Party”, de 1773. O Parlamento inglês entregara o monopólio do comércio do chá à Companhia das Índias Orientais, pertencente aos capitalistas ingleses. Em resposta, os americanos jogaram ao mar o carregamento de chá dos navios da companhia que estavam no porto de Boston.

A balança comercial era desfavorável aos britânicos, que tinham comprado 12.700 toneladas de chá em 1720 e, em 1830, já tinham passado de 360 mil toneladas. Por outro lado, na primeira metade do século XIX o ópio representava o grosso das exportações britânicas para a China. Quando a sua importação foi proibida pela dinastia Qing, os britânicos lhe declararam guerra.

A droga era vendida ilegalmente aos chineses por mercadores ingleses que a trocavam por seda, porcelana e chá. Será por acaso que esses produtos dominam a cena de Alice, por meio do Chapeleiro Louco e seus comensais − a Lebre de Março, o Gato Risonho e o Coelho Branco? (...) a “elite social” do País das Maravilhas.

 O nome original do país com o qual a menina Alice sonhava todas as noites, aliás, era simplesmente “Underland” – o underground, instância social em que se situavam as transações mercantis envolvendo o produto aspirado pela Lagarta Azul que, ao fim da história, “morre” para se transformar em borboleta da mesma cor. Aí a simbologia se completa: ao longo da história, os ingleses trocam o comércio subterrâneo de escravos e drogas por mercadorias mais nobres, como produtos manufaturados.


Na versão de Tim Burton, antes de recusar o pedido de casamento do filho de um Lorde, a Alice cai na toca do Coelho. É importante notar que essa queda se prolonga e, ao seu término, a personagem cai sentada sobre o teto de uma sala, com os cabelos para cima. Ao olhar em torno, ela depara com um candelabro em que as velas se acham com a chama virada para baixo e, aí, cai ao chão. Isso indica que o fundo da toca coincide com um local antípoda à Europa, ou seja, o extremo oriente do planeta, onde se localiza a China.

Após o término da fantástica aventura no mundo subterrâneo, ela encara o mundo real: recusa o pedido de casamento e chama o pai do noivo para uma conversa privada. É quando ela lhe propõe sociedade num empreendimento comercial no império da Grande Muralha. (...) a protagonista deve ter vislumbrado uma realidade futura por trás dos símbolos contidos naqueles sonhos recorrentes desde a infância. E, numa pré-munição, visto um confronto interno entre brancos e vermelhos. Branco, como a droga e como era designado o próprio chá chinês obtido da camellia sinensis – chá branco. E vermelho, como é a bandeira da China, que na marinha britânica também é a cor da bandeira que representa guerra. Uma batalha da qual ela mesmo participaria (do lado branco!). Os ocidentais venceram a Guerra do Ópio e, em resultado a China abriu 50 de seus portos para o comércio com estrangeiros e a ilha de Hong-Kong permaneceu sob o domínio inglês até 1997.

A hipótese é que Tim Burton e a roteirista Linda Woolverton desenvolveram duas histórias para o filme, uma recheando a outra. (...) para poder trabalhar com dois níveis de dramaturgia, fazendo com que o plano do discurso realista enfatize e valorize a narrativa fantástica do País das Maravilhas (...), que termina com um insight de uma viajem de negócios para a China. Uma alegoria surreal e onírica sobre o colonialismo britânico, em busca das maravilhas da China.

No final das contas, o que trouxe o grande sucesso do filme foi seu visual belissimamente acabado. Os efeitos especiais são ótimos, o figurino impecável, a make dos atores é absolutamente perfeita e a construção que Tim faz de cada personagem é realmente bem interessante. Há uma grande beleza estética e as reconstruções dos cenários de Lewis Carrol foram feitas de forma extremamente cuidadosa. Do ponto de vista dos efeitos tecnológicos (3D), do design e da criatividade, não temos o que reclamar! Mas você fica o tempo inteiro esperando algo que não vem no filme.

A atriz que faz Alice não convence. Parece mais uma jovem revoltada. Não imprime personalidade. Johny Deep fica muito bom como o Chapeleiro e Helena Bonham Carter como a Rainha Vermelha rende boas risadas (“Cortem-lhe a cabeça!”). Mas todos os personagens ganhariam muito se a história apresentasse o conteúdo das histórias do Lewis Carrol (Alice no país das Maravilhas e Alice Através do Espelho). E aí, entendemos a grande dificuldade que essa empreitada apresentava: como falar sobre uma personagem que não cresceu, sem revisitar os clichês já conhecidos da história (a toca do coelho, o chá com o Chapeleiro, a lagarta altiva, a bebida que faz diminuir e o biscoito que faz crescer...). Tim Burton não teve de onde inventar de uma história que já está acabada.

Não é um filme infantil e nem adulto. É um filme, somente.
Para aqueles que desejarem ler a crítica de Lucino Ramos na íntegra, clique aqui.


Fica a dica! =)

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